Família de educadora de Janaúba agoniza diante do descaso: Governo de Minas Gerais atrasa seguro, e família de professora fica devendo funeral


(Por Gabriel Ronan, O Tempo) O governo de Minas tem atrasado por meses o pagamento de seguros de vida e pecúlios de servidores que morreram. O TEMPO conversou com famílias que convivem com o problema, entre elas a de uma professora falecida em agosto do ano passado. Dois filhos têm direito ao recurso, cerca de R$ 50 mil no caso dela, mas não receberam o valor. Sem o dinheiro, eles devem o funeral da mãe, vítima de uma pneumonia.

“Minha mãe foi professora do Estado por cerca de 30 anos, sempre trabalhando com o ensino fundamental em Janaúba (Norte de Minas Gerais). Esse dinheiro seria importantíssimo para a gente, porque eu e minha irmã estamos desempregados. Só vivo de bicos, cuidando de idosos. Se não resolver até março, abril, vou procurar um advogado. Estamos devendo até o funeral dela, que custou R$ 3.000”, diz um morador de Montes Claros, que preferiu não ser identificado.

Como é
Há três tipos de benefícios. O pecúlio é pago após o falecimento do servidor como uma indenização aos herdeiros. Metade vai para o cônjuge sobrevivente e a outra metade, para os filhos. Já o seguro coletivo também é uma indenização após a morte, mas nesse caso o servidor pode especificar, ainda em vida, quem receberá o benefício, como em um testamento. Há, ainda, o seguro do cônjuge, que assegura um repasse ao servidor por falecimento do parceiro.

Há casos, como o da família da professora de Janaúba, em que a família tem acesso tanto ao pecúlio quanto ao seguro coletivo. Os recursos são recolhidos mensalmente, retidos na fonte dos vencimentos.

Outra família prejudicada também conversou com a reportagem. Dessa vez, o recurso é de aproximadamente R$ 100 mil. Novamente, se trata da morte de uma servidora da educação, uma diretora aposentada que trabalhava em Juiz de Fora, na Zona da Mata.

“Somos cinco herdeiros. Cada um tem direito a R$ 23,5 mil. O benefício foi deferido em outubro, mas não há qualquer sinal de pagamento, embora os descontos estivessem rigorosamente em dia. Era concursada. Enquanto isso, o governador está posando de bom gestor. Acredito que, como todos os dias há óbitos de servidores, os casos abrangem toda Minas”, lamenta um dos filhos, sob anonimato.

A família de Juiz de Fora também sofre com dívidas. “Estamos devendo a cuidadora (de idosos). A gente tenta dialogar com ela. Está aguardando, mas não sabemos até quando vai esperar. É uma situação lamentável. Um absurdo”, diz o filho.

O Estado faz pagamentos periódicos. Conforme o site do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado (Ipsemg), a última quitação se refere a pedidos de seguros e pecúlios autorizados em maio do ano passado, ou seja, quase um ano atrás. Vale ressaltar que essas pessoas faleceram antes desse período, já que o deferimento do acesso ao recurso leva tempo, diante do protocolo e da análise da documentação do servidor em questão.

Sem retorno, a família de Juiz de Fora chegou a fazer contato com os canais de atendimento do governo. A resposta enviada a ele não dá sequer uma previsão. “Não temos a informação de previsão de pagamentos, uma vez que dependem de liberação financeira por parte do governo (Fazenda). Informamos que os pagamentos seguem ordem de deferimento dos processos, e, no último pagamento, ocorrido em 26 de dezembro de 2023, foram pagos processos deferidos até parte do dia 25 de maio de 2023”, informou o Estado na ocasião.

Em nota, o governo informou que as indenizações são pagas pelo Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (Ipsemg), “a partir dos recursos arrecadados com as contribuições dos segurados”. “Devido ao atual momento fiscal do Estado, o Ipsemg está em tratativas para regularizar a situação, juntamente com a Secretaria de Planejamento e Gestão e a Secretaria de Fazenda”.

Advogado diz que problema é recorrente
Especialista em atendimento de servidores pensionistas de Minas, o advogado Egídio Gomes afirma que o problema no pagamento de seguros e pecúlios vem de longa data. “Eu me lembro que no governo do (Fernando) Pimentel (PT) não houve pagamento de tipo algum. Ou a pessoa entrava na Justiça, ou não recebia. Acho que o problema começou até no governo anterior (Antônio Anastásia, do PSDB)”, diz.

Apesar das dificuldades, Egídio não tem aconselhado os clientes a recorrer à via judicial para receber os recursos. “Agora, o governo está pagando. Aos poucos e com atraso, mas está pagando. Vale mais esperar um, dois anos, do que entrar na Justiça. É certo que a família vai ganhar, mas o Estado vai recorrer à segunda instância. Pode demorar quatro, cinco anos para receber. Ainda tem que pagar os honorários do advogado, que ficam em cerca de 20% do valor da causa”, afirma o especialista.

Números
Só em janeiro, dados do Ipsemg mostram que o governo de Minas deferiu o acesso de 233 famílias a um dos três benefícios com atrasos recorrentes. São 204 núcleos com direito ao pecúlio, 188 ao seguro coletivo e 13 ao seguro de cônjuge.

Há, inclusive, casos que chamam a atenção, nos quais até 21 pessoas diferentes têm direito ao pecúlio e ao seguro de um mesmo servidor. “Há situações nas quais a pessoa tem mais de uma família. Isso é comum. Às vezes, os filhos não entram em acordo. Uns preferem esperar o Estado pagar, enquanto outros recorrem à Justiça. Nesse caso, cada um recebe a sua cota-parte. Há desmembramento do pagamento”, explica o advogado.

Sindicalista reclama de mudança de metodologia
O Ipsemg operacionaliza o pagamento dos seguros e pecúlios, mas o dinheiro é liberado de acordo com a gestão da Secretaria de Estado de Fazenda. Esse organograma é recente e motivo de críticas da presidente do Sindicato dos Servidores do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (Sisipsemg), Antonieta Faria.

“Eu nunca entendi muito bem o porquê dessa mudança. Hoje, o Ipsemg não tem responsabilidade alguma na liberação desses recursos. Tudo que fica centralizado no governo tende a sofrer com problemas como esse, de atraso. Não acho que a situação fiscal do Estado (a dívida bilionária com o governo federal) atrapalhe, porque se trata de um direito das pessoas. Se o Estado deu um benefício que hoje ele não consegue arcar, a culpa não é das famílias. Os servidores pagam os seguros e pecúlios em dia. É uma segurança para as famílias”, diz Antonieta.

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