Janaúba: Estiagem leva à perda de produtividade nos plantios de hortaliças e frutas
Inconformado, o produtor Gustavo Lage mostra a área de 40 hectares onde se viu obrigado a queimar os restos da plantação de banana, com perda de R$ 800 milhões por ano (foto: Solon Queiroz/ Esp.EM ) |
Segundo estudo do técnico Reinaldo Nunes de Oliveira, da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-MG) em Montes Claros, as severas estiagens dos últimos três anos provocaram prejuízo da ordem de R$ 2 bilhões, considerando-se a perda de 1,6 milhão de cabeças do rebanho bovino (de 3,3 milhões em 2010 para 1,7 milhão hoje), a devastação das pastagens e a destruição de lavouras de sequeiro de milho e feijão – que foi de 90% neste ano. Não é outro o quadro na Região Central de Minas, e na Grande Belo Horizonte, que abastecem o estado de hortaliças e frutas. Este é o tema desta quarta e última reportagem da série Seca + Crise, que o Estado de Minas publica desde domingo.
A atividade leiteira também é duramente afetada. Dos 730 rios e córregos da região, em torno de 90% (660) pararam de correr, entre eles rios de maior porte como o Verde Grande e o Pacuí, que secou totalmente pela primeira na história. Com a falta de chuvas, a barragem do Bico da Pedra, construída no Rio Gorutuba, teve o seu nível de vazão reduzido para 19%, com a captação atingindo o chamado “volume morto”. Como consequência, os 485 irrigantes instalados no Projeto Gorutuba (sendo 70% deles pequenos agricultores, 20% médios e 10% grandes produtores) passaram a enfrentar o racionamento.
O fornecimento, hoje, está limitado em 65%. Ou seja, os produtores recebem 35% da cota de água que tinham antes. Além disso, foi adotado um sistema de rodízio. O racionamento fez com que muitos produtores se vissem obrigados a suspender a irrigação de partes dos seus plantios, abandonando os bananais, que praticamente deixam de produzir quando não são irrigados.
Grande produtor na região do Gorutuba, Gustavo Lage administra uma empresa familiar, que contava com 330 hectares de plantios irrigados no Gorutuba e, diante da escassez hídrica, teve de reduzir a atividade a 200 hectares, interrompendo o plantio de banana em 130 deles. Além de deixar de produzir, o empresário relata que ele e seus filhos tiveram prejuízo da ordem de R$ 3,25 milhões. O dinheiro foi usado no preparo do solo (R$ 25 mil hectares).
Gustavo Lage mostrou à reportagem do EM uma área de 40 hectares, onde cultivava banana. A plantação teve de ser derrubada e, agora, a família iniciou o preparo para plantar capim na área. “Eu não queria fazer isso, mas fui obrigado devido ao racionamento de água. Quando a barragem (Bico da Pedra) voltar ao seu nivel normal, vou plantar banana na mesma área novamente”, afirmou o produtor, acresentando que com a interrupção do plantio irrigado nos 40 hectares, o prejuizo é de R$ 800 mil por ano.
Os pequenos produtores do Gorutuba também reclamam das dificuldades enfrentadas. “Tive uma queda na produção de 60%”, revela José dos Reis Batista, que trabalha em um lote de seis hectares. Ele disse que colhia, em média, 250 caixas de banana por mês. Com o rodízio no fornecimento de água, a produção caiu para 75 caixas por mês. “A minha esperança é que Deus mande chuva”, afirma Batista.
CAOS ANUNCIADO
O presidente da Abanorte, Saulo Brezinski Lage, lembra que, se o nível do reservatório reduzir abaixo do nível mínimo de 12%, a retirada de água da barragem terá como prioridade o abastecimento da população, conforme determinação da Agência Nacional de Águas (ANA). A represa garante o insumo às cidades de Janaúba e Nova Porteirinha, além de fornecer água para os caminhões-pipas que atendem centenas de comunidades rurais dos municípios da região castigados pela seca.
“Se o fornecimento de água da barragem do Bico da Pedra para o Projeto Gorutuba for interrompido, será um caos econômico e social para a nossa região”, alerta. Para evitar o quadro caótico, os produtores da região esperam a retomada das obras, orçadas em R$ 55 milhões, de substituição dos antigos canais de irrigação, feitos de concreto, por tubulação, que visa a eliminar desperdícios e garantir a economia de de água da ordem de 40%. Segundo a Abanorte, os serviços foram iniciados em janeiro e interrompidos em maio deste ano, devido à falta da liberação de recursos por parte do Governo Federal.
Baixo retorno e fraca procura
Contagem e Abaeté – O calor reduz a produtividade de legumes e hortaliças e a estiagem que seca as nascentes limita a irrigação. Além disso o consumidor está mais cauteloso no momento de fazer a feira. A combinação de seca e demanda menor tem feito os produtores postergaram planos de aumentar as áreas de cultivo e muitos já cortam pela metade o tempo de irrigação. “Com a seca, minha produção caiu 50% e para piorar quem antes comprava seis caixas de morangos, agora leva duas”, reclama Marcelo Sebastião, 38, produtor da fruta em Barbacena, na Região Central, que diante dos desafios do mercado não pensa em ampliar a lavoura.
Minas Gerais deve produzir, neste ano, 2,75 milhões de toneladas de hortaliças, o que inclui, 32 espécies de verduras e legumes. Segundo a Emater-MG, o volume é 5% menor ante o do ano passado. “Principalmente na Região Metropolitana de Belo Horizonte existe uma grande preocupação com o uso da água que não pode competir com o consumo humano. O produtor está mais pressionado pela alta da energia elétrica, do petróleo e do dólar que afetam diretamente os preços dos insumos”, avalia Georgeton Silveira, coordenador técnico estadual de olericultura da Emater.
Os principais componentes que formam o adubo são importados. Ao mesmo tempo, Georgeton lembra que o produtor está sujeito às oscilações do mercado que define os preços, segundo a velha lei da oferta e demanda. “Não há uma política de preço mínimo, que protegeria o produtor de grandes depreciações no valor do alimento”, observa o especialista. Na ponta do lápis, Marta Gonçalves, produtora de hortaliças no Centro-Oeste do estado diz que o custo de produção avançou 30% em 12 meses. Sua horta é uma profusão de temperos e folhas de qualidade e perfumes variados, algumas em caráter experimental, outras que já conquistaram o freguês.
Andando rápido entre a plantação, ela aponta o incremento de cada item e não tem dúvidas. Vendeu 10% menos neste ano. “As famílias estão enfrentando dificuldades e estão, sim, reduzindo o consumo”, garante. Para driblar a seca, e oferecer alimentos verdes, exigência para encher os olhos do cliente, Marta está irrigando sua horta uma vez ao dia. Antes, repetia o processo duas vezes. “Tenho receio de que falte água.”
Pressão na inflação, a seca favorece ainda mais os altos e baixos nos preços dos hortifrutis. Márcio da Silva, produtor de pimentão em Carandaí, na porção Central do Estado, diz que o tempo muito quente queima a planta e compromete a qualidade. Ele estima que neste ano a produtividade caiu 10%. “Tive que reduzir o tempo da irrigação pela metade para economizar água.”
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