Uma bomba política estremeceu Itacarambi nesta semana. Em uma decisão contundente e histórica, a Justiça Eleitoral da 148ª Zona Eleitoral de Januária anulou o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) do Partido Social Democrático (PSD) e, em um efeito dominó devastador, declarou nulos todos os votos da legenda nas eleições municipais de 2024. A sentença arrasadora derrubou também o mandato do único vereador eleito pelo partido, Euci Nascimento Sá, que perde imediatamente sua cadeira na Câmara Municipal.
A decisão, proferida em 07 de novembro de 2025 no processo nº 0601152-69.2024.6.13.0148, escancarou uma gravíssima fraude à cota de gênero. Segundo o juiz eleitoral Rodrigo da Silveira, o PSD teria armado uma verdadeira operação para simular candidaturas femininas e burlar a lei que protege e amplia a participação feminina na política.
Dois nomes foram atingidos com força máxima:
— Elaine Farias Lacerda, apontada como candidata “fictícia”;
— Emerson Barbosa Macedo, advogado, candidato e dirigente partidário do PSD, acusado de articular e orientar a fraude.
Ambos foram declarados inelegíveis por oito anos, até 2032.
Um escândalo que expõe as entranhas do sistema político
A Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) foi apresentada pelo Ministério Público Eleitoral e por Jordinei Rodrigues Cirqueira, que denunciaram uma engrenagem clandestina montada para forjar suposto cumprimento da cota feminina prevista no artigo 10, § 3º, da Lei 9.504/1997.
A sentença é categórica: a cota não é uma burocracia, mas um pilar democrático para romper barreiras históricas e garantir às mulheres acesso real ao espaço político. Citando a Constituição Federal e tratados internacionais, o magistrado classificou a fraude como “um atentado direto à igualdade substancial entre os gêneros”.
O golpe, segundo a Justiça, foi arquitetado com frieza.
Indícios fortes, provas contundentes e uma sentença que não deixou pedra sobre pedra
A investigação teve como base a Súmula 73 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Votação inexpressiva, ausência de campanha, prestação de contas zerada e movimentação financeira inexistente — qualquer desses elementos já poderia caracterizar a fraude.
No caso das três mulheres lançadas pelo PSD — Elaine Farias Lacerda, Joselma Pereira Matos e Liliam Pereira Nascimento — a votação ridícula, entre três e quatro votos cada, acendeu o alerta.
Mas foi Elaine quem protagonizou o enredo mais explícito.
O caso Elaine: áudios, arrependimento e uma cirurgia que derrubou o castelo de cartas
A Justiça destacou que a candidatura de Elaine reunia todos os indícios da Súmula 73. Sua ausência completa de campanha nas ruas e nas redes, nenhuma movimentação financeira e falta absoluta de atos políticos já compunham o cenário suspeito.
Mas o que derrubou o PSD foram os áudios confirmados pelo próprio dirigente partidário, Emerson Barbosa Macedo.
Nos áudios, considerados peça-chave da fraude, Emerson dá instruções diretas:
— “Tem que arrumar uns votos aí pra você, tem que ter um mínimo, você tá entendendo?”
— “Fecha a conta segunda-feira, belezinha, certinho, sem problema.”
A Justiça interpretou o diálogo como orientação explícita para disfarçar a candidatura fictícia.
Como se não bastasse, Elaine havia passado por uma cirurgia em 09/08/2024, com recomendação médica de 90 dias de repouso. Mesmo assim, sua candidatura foi registrada em 15/08/2024 — apenas seis dias depois. Para o juiz, isso prova que seu nome foi colocado apenas para simular a cota de gênero.
Dirigente partidário, advogado e peça central da fraude
Emerson Barbosa Macedo, segundo a sentença, não era um mero coadjuvante. A Justiça o classificou como agente ativo na construção da fraude, destacando sua dupla responsabilidade como dirigente e advogado — alguém que, por domínio técnico, deveria zelar pela legalidade, mas teria feito exatamente o oposto.
A sentença descreve sua atuação como “estratégia consciente de esvaziamento político de candidaturas femininas” e aponta que sua conduta ultrapassa a irregularidade: trata-se de violência simbólica e institucional contra as mulheres.
Sobra para todos: PSD perde todos os votos e derruba seu único vereador
Mesmo sem prova robusta de participação direta do vereador Euci Nascimento Sá na fraude, seu mandato foi cassado. A Justiça é clara: a contaminação do DRAP atinge toda a chapa proporcional — suplentes, candidatos e eleitos.
Com isso, todos os votos do PSD foram anulados.
A Câmara Municipal terá reconfiguração total após a retotalização dos votos e nova distribuição das vagas.
A Justiça Eleitoral envia um recado ao Brasil
O caso de Itacarambi se soma a um conjunto de decisões do TRE-MG e TSE que endurecem o combate à fraude de gênero, considerada uma das práticas mais corrosivas da democracia contemporânea. A cota de gênero tem sido tratada como cláusula pétrea da representatividade, e qualquer manobra para burlar esse mecanismo enfrenta agora punições severas e exemplares.
A cassação integral da chapa e a inelegibilidade dos envolvidos reforçam a mensagem: não há mais espaço para fraudes mascaradas de participação feminina.
O escândalo continua: PSD deve recorrer, mas clima é de incerteza total
A decisão ainda não é definitiva.
O PSD, Elaine e Emerson podem recorrer ao TRE-MG e, posteriormente, ao TSE.
Em nota, o advogado Emerson Barbosa se pronunciou:
“A sentença foi omissa em relação às provas produzidas nos autos. Será apresentado recurso adequado e aguardamos a reforma da decisão.”
Mas enquanto o recurso não sobe, o efeito político é devastador:
o PSD sai varrido do Legislativo, seu único vereador perde o mandato, duas figuras centrais tornam-se inelegíveis e a legenda enfrenta a maior crise de sua história recente em Itacarambi.
O caso promete abalar o xadrez político local por muito tempo — e serve como alerta nacional para quem ainda insiste em usar as mulheres como peças descartáveis em jogos eleitorais.
Informações Fábio Oliva
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