Moradores de Pai Pedro, Minas Gerais, pedem por água doce

Estudantes de Pai Pedro fazem manifestação por água doce (Foto: Nicole Melhado / G1)
Cerca de 4 mil moradores da zona rural dependem de caminhões pipa. 
Caravana Vidas Áridas visitou a cidade e acompanhou a situação.

(G1) Se a luta não é só por R$0,20, os moradores da cidade de Pai Pedro, no Norte de Minas Gerais também fazem seu apelo e pedem por uma única reivindicação: água doce. Inspirados também pelo projeto Vidas Áridas, cerca de 400 alunos da escola estadual Santos Dumont, acompanhados pela banda municipal, seguiram em caminhada até a Câmara Municipal a fim que o pedido fosse ouvido pelas autoridades.
Nessa sexta-feira (28), 12 representantes municipais da região da Serra Geral, que passam por dificuldades semelhantes, se reuniram com representantes da companhia de saneamento, a Copasa, da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) de Minas Gerais e do Departamento Nacional de Obras de Contra as Secas (DNOCS).
“Desde o início nossa ideia era que este projeto não fosse restrito a nós, e vemos que ele se tornou um movimento independente, nem sabíamos que este protesto aconteceria”, diz Geraldo Humberto, um dos idealizadores do projeto Vidas Áridas.
Segundo o prefeito de Pai Pedro, Eujacio Rodrigues, a cidade possui atualmente cerca de seis mil habitantes, dos quais quatro mil vivem na zona rural, onde a situação é mais grave. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da cidade é 0,575, considerado muito abaixo do ideal pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Os moradores do centro urbano recebem água tratada pela Copasa, que embora mais salgada que a habitual, devido a quantidades maiores de magnésio, cloreto e sódio, condição típica de regiões calcárias, ela é própria para o consumo.
Água sem tratamento é vendida em Pai Pedro
(Foto: Nicole Melhado / G1)
Mesmo assim, a dona de casa Elizabeth Mendes Rocha prefere comprar água doce para beber, cozinhar e tomar banho. Todo mês ela compra dois tambores de 200 litros, por R$ 12,00 cada. “Eu não gosto dessa água da torneira, passo mal, a pele fica seca, então prefiro comprar a água mesmo”, revela.
Mas a engenheira química Carolina Oliveira Santos alerta para os perigos de consumir esta água de procedência duvidosa. “É possível ver que há um grande risco de contaminação somente observando o manuseio desses galões e a distribuição para dentro de casa. O grande problema está na higienização dessa água. Segundo o vendedor, a água vem de um rio, sem qualquer tratamento”, ressalva.
A um risco maior estão sujeitos os quatro mil moradores da zona rural. De acordo com o prefeito Eujacio Rodrigues, neste ano nenhum caminhão pipa da defesa civil pôde atender o município. Assim, a única saída foi o aluguel de um caminhão que busca água no Rio Serra Branca e leva para estas quase 120 famílias a cada 90 dias. “Quando não chove, este caminhão é a única forma de abastecimento das famílias. Se ainda há água nas cisternas, estes 16 mil litros levados pelo caminhão são só um auxílio para utilidades domésticas e duram aproximadamente um mês. Mas quando essa é a única água que possuem, ela dura apenas 15 dias”, explica. 
Água sem tratamento é vendida em Pai Pedro
(Foto: Nicole Melhado / G1)
Mas às margens do Rio Serra Branca é possível ver lixo e erosão. “A vegetação presente no rio é o que mantém a humildade do solo, mas constamos o assentamento da terra provocado pelo pisoteio dos animais que também consomem essa água. Possivelmente há uma contaminação microbiológica provocada pelas fezes desses animais”, esclarece a engenheira química.
A produtora rural Judite Rodrigues Jesus desconhece estes riscos e se sente aliviada por receber em casa a água do caminhão pipa. “Já ficamos 10 dias sem água e contamos com a solidariedade dos vizinhos. Anos atrás, quando não tínhamos a caminhão para trazer água, tínhamos que ir buscar mesmo com a lata d’água na cabeça”, conta.
Essa água serve mesmo só para o consumo da família e dos animais. O agricultor José Soares de Oliveira já chegou a ter 40 cabeças de gado, mas hoje tem apenas uma. “Uma outra morreu há pouco tempo, estava doente. Esta água não serve para plantar, só quem tem sistema de irrigação consegue cultivar alguma coisa”, conta.
Agricultor mostra pasto que chegou a abrigar 20
cabeças de gado (Foto: Nicole Melhado / G1)
O filho do casal, o também pecuarista Darci de Oliveira, de 51 anos, conseguiu reunir 20 cabeças de gado, mas a forte estiagem, considerada a pior dos últimos 40 anos, lhe obrigou a se desfazer de sete para que estas não morressem de fome.
“Hoje nos sustentamos com o ‘Bolsa Família’. Meus dois filhos mais velhos foram embora para São Paulo, porque aqui não tem trabalho, assim como eu fiz em 2008, quando fui trabalhar no corte de cana. Espero que um dia eles também voltem”, diz o agricultor emocionado.
Cerca de 90% da produção rural de Pai Pedro foi perdida por causa do forte período de seca.  Mesmo com a última chuva no mês de abril, o solo ainda se recupera da estiagem que se estende desde 2011.
“Por causa de brigas entre Estado e União, quem sofre é o povo de Pai Pedro. O povo não quer mais cesta básica, quer trabalho, não quer mais caminhão pipa, quer poço artesiano”, afirma o ambientalista e membro do Movimento Vidas Áridas Sóter Magno.

Soluções
Sobre a questão da salinidade da água, o representante da Copasa José Ponciano Neto informa que há um projeto em fase de aprovação para a construção de uma adutora para trazer água já tratada de Serranópolis para Pai Pedro no valor de R$1,7 milhões. Já sobre o sabor da água, a companhia afirma que estão sendo realizados estudos, mas descartou a instalações de dessalinizadores em curto prazo.
Segundo o coordenador estadual do DNOCS Marco Antônio Graça Câmara, a perfuração de poços públicos é melhor que a coleta do rio. “A partir do dia 17 de julho abriremos outros cinco poços em Pai Pedro, graças a verba designada pelo Governo Federal, cerca de R$ 57 mil serão gastos para a perfuração de cada poço”, afirma.
Mas para o coordenador, esta é uma solução emergencial, o ideal seria a construção de barramentos que custam entre R$3 e R$ 5 milhões. “São necessários seis meses para o estudo do solo e elaboração do projeto e outros seis meses para a construção. A situação é a mesma de Januária a Espinosa, seria necessária a construção de cerca de 20 barragens”, diz Câmara.
Os prefeitos da região querem ainda a inclusão de mais 63 cidades na região semiárida a fim de serem atendidos por projetos do governo federal de enfrentamento da seca. “Já vivemos esta seca por muito tempo e este ano não conseguimos nenhum caminhão pipa da Defesa Civil. São outros 106 municípios em situação emergencial e apenas 90 caminhões pipa foram adquiridos”, afirma o prefeito de Pai Pedro.

Cidade de Pai Pedro é uma das cinco com menor IDH do estado de Minas Gerais (Foto: Nicole Melhado / G1)
Vidas Áridas
A Caravana Vidas Áridas é uma iniciativas dos jornalistas Geraldo Humberto e Délio Pinheiro, com o apoio da Inter TV, e busca fomentar debates sobre a pior seca dos últimos 40 anos e apresentar soluções para as cidades mais atingidas no Norte de Minas Gerais.
Em ocasião da Festa de São Pedro, uma exposição fotográfica e um vídeo documentário foram exibidos. A caravana contou ainda com a apresentação do grupo de teatro Fibra, de Montes Claros. “Este é um tema que não se esgota contamos este problema da seca de uma forma poética”, conta a atriz Karla Selene.


Pablo de Melo
pablo-labs@hotmail.com

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