Um ano depois de facada em Bolsonaro, irmãos de Adélio Bispo tentam se reerguer: 'Temos que continuar vivendo'

(G1) Um ano após o atentado contra o então candidato à presidência Jair Bolsonaro, a família do autor da facada, Adélio Bispo, ainda procura entender os motivos que o levaram a cometer o crime. Os irmãos dele, que moram em Montes Claros (MG), preferem não ter os nomes divulgados. Eles têm medo da exposição e de represálias.

“A gente está levando a vida, né? Não pode parar. Temos que continuar vivendo. A gente fica muito sentido. Às vezes eu deito na cama à noite e fico pensando, mas não chego a conclusão nenhuma”, fala o homem de 52 anos, que é o mais velho entre os cinco irmãos.

Adélio foi considerado inimputável pela Justiça, ou seja, não pode ser punido criminalmente, por ter doença mental. A prisão foi convertida em internação por tempo indeterminado. Pela decisão, o agressor deve permanecer num presídio de Campo Grande (MS).

Depois do atentado, a saúde do irmão de Adélio ficou ainda mais frágil e inspira cuidados redobrados. “Hoje eu tomo 12 remédios todos os dias, porque ao longo da vida fiz três angioplastias e enfartei quatro vezes”, completa.

O homem mora com a esposa há mais de 30 anos em uma casa modesta, em um bairro afastado da região central. “Nós não temos costume de mexer com mídia, com televisão, isso tudo traz apavoramento pra gente. Até a Polícia Federal esteve aqui, a vida virou de cabeça para baixo”, diz a cunhada de Adélio Bispo.

Adélio Bispo saiu de Montes Claros quando tinha 15 anos, buscando por oportunidades de trabalho. Ele chegou a ficar fora por oito anos, sem retornar para ver a família. Nos últimos anos, o contato era raro e acontecia por telefone ou redes sociais. Quatro meses antes do atentado ele esteve na cidade.

“Ele apareceu do nada, sem avisar, como fazia. Chegou aqui em casa de manhã e foi embora à tarde. A gente não tinha o telefone e nem o endereço dele, só sabíamos que ele trabalhava fora, mas sem detalhes”, conta uma das irmãs, que mora em uma comunidade rural.

Na última vez em que esteve em Montes Claros, a família chegou a sugerir que Adélio procurasse por ajuda psicológica, já que ele estava com o hábito de conversar sozinho e demonstrava fanatismo político, que eles consideravam anormal. Apesar de falar muito sobre o assunto, ele não dizia em qual candidato votaria.

Meses após ter saído de perto dos irmãos, eles foram surpreendidos com a notícia do atentado na televisão. “Minha filha viu ele e gritou 'pai, é tio Tuca na televisão'. Eu nem sabia que ele estava nessa cidade. Foi um choque, nunca imaginava que poderia acontecer uma coisa dessas”, relembra o irmão mais velho.

Ligação antes do atentado
Um dia antes de Adélio Bispo esfaquear Jair Bolsonaro, o irmão dele recebeu duas ligações de um número desconhecido, com código de área de Juiz de Fora (MG), cidade onde os fatos ocorreram.

“Acho que foi ele que ligou, fico com aquele sentimento que se talvez eu tivesse atendido não tinha acontecido isso, porque ele poderia ter desabafado comigo e talvez eu conseguiria tirar da cabeça dele, se ele já tivesse de planos de fazer isso”, lamenta o irmão.

O pai de Adélio trabalhou em propriedades rurais de Montes Claros. Por conta disso, a família se mudava com frequência. Quando o patriarca ficava doente, a responsabilidade de garantir o sustento ficava por conta do irmão mais velho.

“Eu fico sentindo como se fosse o pai dele, porque eu que tinha que sustentar quando nosso pai adoecia. Não sei para as outras irmãs, mas para mim é ruim demais, sinto a responsabilidade de pai”, lamenta.

Carta para o sobrinho
O único contato que a família teve com Adélio foi uma carta endereçada a um dos sobrinhos, com quem ele morou por um tempo e trocava mensagens nas redes sociais, mesmo distante. Na correspondência datada de seis de maio e enviada do Presídio de Campo Grande (MS), o condenado por tentar matar Jair Bolsonaro manifesta o desejo de ser transferido para Montes Claros.

“Estou tentando sair daqui o quanto antes, pois esse presídio é um lugar de maldições. Um presídio projetado pela maçonaria, onde o satanismo maçom é terrível. Estão tentando me levar à loucura a qualquer custo, assim como já fizeram com muitos que passaram por aqui. Há uma conspiração bem montada para isso. Mas estou sendo firme apesar das investidas satânicas da maçonaria”, disse na carta.

Adélio ainda pede para que o sobrinho procure por um advogado da cidade, que cobraria um valor menor pela defesa e se despede desejando “tudo de bom”.

“Era uma criança alegre demais. Não era de farra não, nunca bebeu, nunca fumou, o negócio dele era trabalhar e ir para a igreja, só isso. Quando mais jovem, ele gostava era de academia, mas depois de velho não gostava de nada não, só da tal da política. Acho que isso pode ter adoecido ele. Eu nem sei o que pensar, é uma coisa que a gente não tem resposta. Eu queria encontrar com ele para perguntar, tudo que a gente fica sabendo é pela mídia”, finaliza o irmão.

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